Desafios Fiscais e Sucesso Judicial: Como o Governo Navega em Águas Turbulentas

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Desafios Fiscais e Sucesso Judicial: Como o Governo Navega em Águas Turbulentas

Desafios da Reforma Tributária: Impactos da Tese do Século e Teses Filhotes em Debate

Cerca de uma década após um dos maiores reveses para a União na esfera tributária, a discussão em torno da cobrança do “imposto sobre imposto” continua a ser um tema delicado e de grande relevância nas esferas jurídica e fiscal do Brasil. Conhecida como a “tese do século”, essa questão envolve a possibilidade de as empresas excluírem o ICMS – principal tributo estadual – da base de cálculos do PIS e da Cofins, trazendo à tona implicações significativas para os cofres públicos e para a economia do país.

O Contexto da Tese e suas Implicações

Em 2021, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) reverberou pelo sistema tributário: foi determinado que a União deveria devolver quantias pagas indevidamente por esse tributo desde março de 2017. Trata-se de uma questão básica: se o ICMS é um tributo, ele não pode ser a base de cálculo para outros impostos. Estima-se que essa decisão possa ter causado um impacto superior a R$ 500 bilhões, um valor que as empresas ainda não conseguiram recuperar na totalidade.

Entretanto, a questão não se limita à “tese do século”. Um novo cenário se desenha com o que os especialistas estão chamando de teses filhotes, que dizem respeito a outras disputas tributárias, em que as lógicas aplicadas ao caso do ICMS não estão sendo igualmente consideradas. Essas novas teses têm gerado incertezas relacionadas à capacidade do governo de sustentar suas finanças públicas, especialmente em um período de insegurança fiscal.

Riscos e Reações do Governo à Nova Contextualização

Para tentar evitar novas derrotas no campo jurídico, o governo tem adotado uma abordagem que enfatiza a necessidade de um equilíbrio orçamentário. Essa argumentação tem encontrado eco no STF, especialmente considerando que a proposta de lei orçamentária para 2026 sinaliza perdas potenciais ou prováveis que podem totalizar R$ 759 bilhões em disputas fiscais. Deste montante, cerca de 30% está atrelado à polêmica questão da cobrança de tributos sobre tributos.

De acordo com André Melo, advogado do escritório Cescon Barrieu, a grande vitória obtida pelos contribuintes por meio da tese do século deixou marcas profundas nas estruturas fiscais do Brasil. Ele acredita que essa possa ser uma das últimas vitórias expressivas de contribuintes, dado o nível de atenção que o STF passou a dar a esses casos.

As Teses Filhotes e Suas Consequências

Dentre as teses filhotes, duas se destacam em termos de impacto fiscal. A primeira é a inclusão do PIS e da Cofins em sua própria base de cálculo, o que tem causado debates intensos. Em segundo lugar, é a questão da incidência do PIS/Cofins sobre o ISS, imposto municipal sobre serviços, que aguarda apenas um voto para que o julgamento seja finalizado. No entanto, o julgamento está suspenso, com um empate entre os votos, e nenhuma expectativa clara sobre uma resolução.

Rodrigo Bevilaqua, também do escritório Cescon Barrieu, observa que a incerteza em torno do julgamento pode ser benéfica para os contribuintes, dado o quadro atual de um STF cauteloso em suas decisões fiscais. Por outro lado, Alessandro Borges, sócio do Benício Advogados, acredita que algumas vitórias, como a exclusão do ISS e dos benefícios fiscais do ICMS da tributação pelo PIS/Cofins, são praticamente garantidas.

Legalidade vs. Segurança Jurídica

A tributarista Bianca Mareque, do escritório Vieira Rezende, argumenta que o Judiciário tem se mostrado resistente a essas teses filhotes, mas não sente a mesma confiança ou necessidade de rechaçar a questão do ISS. Em seus olhos, as discussões que buscam fundamentação nas normas contábeis se tornam testadas nos tribunais, mas carecem de base sólida para um resultado diferente da jurisprudência já estabelecida.

O professor de direito tributário José Luis Ribeiro Brazuna ressalta que algumas derrotas dos contribuintes têm origem na falta de critérios claros que definam essas teses filhotes. Ele argumenta que muitas dessas discussões envolvem tributos que não são tradicionalmente calculados como parte do preço de uma mercadoria ou serviço. Além disso, enfatiza que a condição fiscal do Brasil impede a validade de novas teses, ainda que legítimas.

A Persistência das Contendas Fiscais

O cenário é sombrio: a União tem demonstrado habilidades cada vez maiores em evitar perdas só nos contenciosos tributários. Em 2024, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) impediu uma perda recorde de R$ 405,8 bilhões em disputas judiciais. Dados recentes apontam que cerca de 75% dos riscos focam em ações relacionadas ao PIS/Cofins, que será substituído pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em janeiro de 2027.

Contudo, o legado das antigas disputas pode perdurar por mais anos. Durante a transição das reformas tributárias entre 2026 e 2032, a inclusão de tributos como ISS e ICMS nas novas bases ainda se mantém incerta e pode abrir as portas para novos conflitos judiciais.

Expectativas Futuras e a Reforma Tributária

O advogado Maurício Barros, do Cescon Barrieu, adverte que a reforma tributária, embora fortaleça a estrutura fiscal do estado, não está isenta de riscos de litígios. Em 2026, um diálogo crucial entre União, estados e municípios será necessário para definir o que se espera durante a transição — uma etapa que promete ser contenciosa.

Com as incertezas pairando sobre a futura configuração tributária do país, o debate sobre a reforma se intensifica e a importância do tema se torna um ponto de atenção não apenas para os operadores do direito, mas também para todos os cidadãos que, direta ou indiretamente, foram afetados por essas mudanças no sistema tributário brasileiro.

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